Eduardo é administrador de empresas e mora em Curitiba. Geraldo é professor de geografia e mora em Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana do Recife. João é cantor e compositor e mora no Rio de Janeiro. Lúcio é engenheiro e mora em Curitiba. Quatro homens com idades e profissões diferentes, vivendo em cidades distintas do país. Têm em comum o fato de serem pais de crianças e jovens com síndrome de Down. Nesse dia 10 de agosto de 2014 em que se celebra o Dia dos Pais, o Movimento Down relata a experiência de cada um desses quatro homens que gentilmente compartilharam conosco, e agora com nossos leitores, suas histórias e as de seus filhos.
Eduardo Caneppele
Eduardo e Matheus. Foto: arquivo pessoal.
Eduardo é casado com Tatiana e pai de Matheus, de 2 anos e 4 meses. Assim como muitos pais de crianças com síndrome de Down, só soube da condição do filho após o parto. A trissomia não foi diagnosticada durante a gravidez e o exame de Cariótipo (estudo dos cromossomos) demorou a ficar pronto. A descoberta foi um susto e os primeiros dias após a notícia foram difíceis para o casal. Conforme ele e a esposa foram pesquisando e se informando sobre a síndrome, descobriram que é possível que indivíduos com Down levem uma vida com qualidade. “Ficamos bem mais tranquilos, porque soubemos que eles estudam, se formam, namoram, casam e até têm filhos”, conta Eduardo.
Esse conhecimento fez com que o pai de Matheus enxergasse novas perspectivas para o futuro do menino. “Vemos que a sociedade está se preparando um pouco mais para conviver com pessoas com necessidades específicas. As escolas estão mais preparadas para a inclusão, o mercado de trabalho está abrindo cada vez mais suas portas. Com isso, vejo o Matheus se formando, trabalhando numa grande empresa no futuro ou quem sabe ensinando outras pessoas com aquilo que ele saberá fazer melhor”, complementa.
Aniversário de 1 anos de Matheus. Foto: arquivo pessoal.
Eduardo sabe que, devido à condição de seu filho, precisa enfrentar desafios específicos, além dos impostos pela paternidade. “Para nós, o desafio está sendo explicar para as pessoas que o Matheus é uma criança como todas as outras, que vai fazer tudo o que uma criança que não tem necessidades específicas faz, só que dentro do seu tempo”, explica. Além disso, ele e Tatiana precisaram adaptar a rotina para lidar com as especificidades da criança. “Antes eu trabalhava das 8h às 18horas. Com a chegada do Matheus, conseguimos adaptar os horários para ficar com ele, levar para aula, levar para as terapias, praticamente meio período todo dia”, conta.
Por conta dessa experiência, Eduardo foi escolhido junto a outros quatro pais para estrelar a Campanha do Dia dos Pais da RCP TV, afiliada da Rede Globo no Paraná. Por uma semana, ele filmou sua rotina com Matheus e as imagens foram editadas e transformadas em um vídeo que vem sendo exibido na TV. “Para mim foi muito gratificante e também emocionante participar dessa campanha. Creio que pude passar algo de bom não somente para pais de crianças com síndrome de Down, mas para qualquer pai. Porque não tem muita diferença você ser pai de uma criança com necessidades específicas ou não”, afirma.
Geraldo Dantas
Geraldo e Átila são super unidos. Foto: arquivo pessoal.
Geraldo é pai de Átila, um jovem de 24 anos que tem síndrome de Down. Mas nem sempre foi assim. Na verdade, a paternidade legal só veio em 2012, quando Geraldo conseguiu, na justiça, o direito de substituir o nome do pai biológico nos documentos de Átila. Até esse momento, Geraldo era, como ele próprio se define, pai socioafetivo. A relação entre os dois começou em 1992, quando o jovem tinha 2 anos e Geraldo, então com 30, era colega de faculdade de Ana Paula, mãe do garoto. Na época, Ana Paula estava separada do pai de Átila, que havia abandonado mãe e filho por causa da síndrome de Down – situação que infelizmente ainda ocorre no Brasil e no mundo.
Geraldo e Átila se conheceram quando o menino tinha 2 anos. Foto: arquivo pessoal.
Felizmente, para Átila e para Geraldo, a trissomia não foi um problema. “Quando conheci a Ana Paula, ela andava com o menino para todos os lugares, porque não tinha com quem deixá-lo. Nós começamos a sair e aos poucos fui me envolvendo (com Átila). Costumo dizer que na verdade foi ele que me conquistou”, conta o agora professor de geografia. Em 1997, o casal começou a morar junto e Geraldo se viu realizando todas as funções de pai – afetiva e financeiramente.
Em pouco tempo, Geraldo e Átila criaram uma forte relação de pai e filho. A ligação é tão forte que pouca gente sabe que o rapaz não é filho biológico de Geraldo. Mas a certidão de nascimento falava o contrário – o menino tinha sido registrado pelo pai biológico – e isso era um problema para o homem que já se considerava pai de fato. “Uma vez, na escola, a diretora disse que eu não podia votar, porque meu nome não estava no documento dele. Foi muito ruim”, lembra. Foi então que ele resolveu procurar um advogado para fazer a substituição.
O processo não foi rápido. O primeiro advogado consultado por Geraldo o desencorajou. Então ele decidiu pesquisar por conta própria. Descobriu a Lei Clodovil, que permite que uma criança adote o sobrenome do padrasto, encontrou casos parecidos pelo Brasil e pediu ajuda a uma amiga, cujo marido era advogado. Resolveram tentar e, em outubro de 2012, conseguiram autorização da justiça para substituir o nome do pai biológico pelo de Geraldo nos documentos de Átila. “Fiquei bastante emocionado quando saiu a decisão. O Ministério Público deu um parecer muito bonito, afirmando que eu já era o pai de fato”, conta.
Passados 22 anos, pai e filho se divertem juntos na região metropolitana de Recife. “Ele é bem socializado, faz natação, estuda numa escola regular, participa do grupo de dança de maracatu da APABB e adora teatro. Nós vamos sempre juntos ao teatro”, relata Geraldo. “Ele me chama de paizão e eu o chamo de gatão, não tenho outros filhos. Considero um presente de Deus tê-lo conhecido”, complementa.
João Cavalcanti
Leia o depoimento completo de João: “Pai é outro lance”
João com Tom e Luna. Foto: arquivo pessoal
João é pai de duas crianças: Tom, de 5 anos, e Luna, de 3 anos e com síndrome de Down. O cantor e compositor carioca conta que sempre teve o dom de lidar com crianças e que acreditava que tiraria de letra a paternidade. Aí veio o primeiro filho, Tom, e mostrou que nada era tão fácil assim e a experiência de irmão mais velho que acumulava não era o suficiente para ser pai. Descobriu que era preciso construir a relação com o filho. Se dedicou. “Resolvi construir. Procurar no meu filho os espaços que cabia a mim ocupar. E tratei de tentar ocupá-los com carinho, limite, intimidade, tempo”, relata.
Em seguida veio a Luna e sua trissomia do cromossomo 21. E mais uma vez João se viu despreparado. “Luna, como que debochando do meu autoproclamado know-how, veio ligeiramente diferente do que eu supunha em meus preconceituosos e limitadíssimos anseios. Um cromossomo a mais e uma interrogação no firmamento. Medo, muito medo de tudo e aquela sensação de começar a construir novamente – às cegas e sem conhecer o terreno”. Continue lendo aqui.
Lúcio Marques
Lucio e Amanda
Foto: blog Rotina Down
Leia o depoimento completo de Lúcio: “O pai escrevendo”
Casado com Simone, autora blog Rotina Down, Lúcio tem duas meninas: Camila, de 11 anos, e Amanda de 5 anos e com síndrome de Down. Ele se considera um pai participativo e conta que sempre esteve presente nas consultas de sua esposa durante as duas gestações. Para ele, Amanda é uma criança como outra qualquer, mas com um tempo próprio, que é preciso respeitar. “Como pai, acredito que devemos aprender rápido a respeitar o tempo de uma criança Down, sem grandes cobranças, sem superproteção. Eu permito que minha filha faça e aprenda as coisas por ela mesma”, escreve em seu relato publicado aqui.
Leia também sobre a história de Flávio Soares, autor das tirinhas “A vida com Logan”, e de seu filho Logan.
– Leia mais: http://www.movimentodown.org.br/2014/08/dia-dos-pais-conheca-historia-de-quatro-homens-e-seus-filhos-com-down